Inadimplência da taxa de condomínio ultrapassa 30%


Após mais de 500 dias de pandemia, os condomínios continuam precisando de muito jogo de cintura para lidar com o novo cenário. Isso porque, além dos desafios da segurança sanitária, eles têm enfrentado um morador que já não era tímido e que continuou fazendo barulho durante a pandemia: a inadimplência.

Segundo um levantamento feito pelo Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) para A TARDE, só no mês de agosto deste ano foram 1.348 ações por inadimplência em condomínios, número que representa um crescimento de 7,2% em relação ao mesmo mês de 2019, antes da pandemia.

O número de inadimplentes, no entanto, pode ser ainda maior, uma vez que recorrer à Justiça acaba sendo a última saída dos condomínios. De acordo com o presidente do Sindicato de Habitação (Secovi), Kelsor Fernandes, antes de ajuizar uma ação, o síndico geralmente conversa ou tenta uma negociação com o morador.

“Quando não tem jeito, ele vai à Justiça, porque é obrigação dele, ele precisa pagar funcionários, luz, manutenção de elevador”.

Em alguns condomínios, como por exemplo nos oito empreendimentos onde a Empresa Bahiana de Condomínios tem síndicos, houve a decisão de não judicializar os débitos que surgiram neste período de pandemia. Segundo Robson Carvalho, síndico profissional e sócio da empresa, a taxa de inadimplência cresceu 30% e eles chegaram a ter débitos de 18 meses de atraso, “mas o momento precisou de uma maior compreensão”.

Para Kelsor e Robson, a inadimplência já era um problema histórico nos condomínios, mas a pandemia da Covid-19 foi responsável por agravar o problema. O síndico profissional Rildo de Oliveira concorda. Segundo ele, a taxa de inadimplência sempre foi um morador assíduo nos condomínios. Mas, desde março do ano passado, com a chegada da Covid-19 ao Brasil, ela passou a ocupar ainda mais espaço: nos três empreendimentos que administra, a taxa de moradores com pagamento atrasado aumentou em 25%.

“Temos moradores que ficaram desempregados, outros que tinham lojas em shoppings ou donos de academia, que tiveram seu negócio fechado por muito tempo. Tudo isso refletiu no pagamento do condomínio. Passamos a ver moradores que nunca foram inadimplentes deixarem de pagar”, conta Rildo.


Alta do desemprego
O economista Lucas Spínola explica que o que Rildo relata é a perda de renda dos brasileiros neste momento de pandemia. O desemprego – que na Bahia atingiu o índice mais alto em nove anos, chegando a 21,3% no primeiro trimestre deste ano – e o fechamento de negócios ou a incapacidade de retomar o nível de performance pré-pandemia ocasionaram uma queda significativa na renda dos baianos.

“Como condomínio ainda não é visto como prioridade, porque há um prazo maior para recorrer à Justiça e o morador ter que pagar ou perder o imóvel, acabou sendo uma despesa que muitos abriram mão”, explica.

Em um dos condomínios onde Rildo é síndico, a inadimplência ficou tão complicada que faltou material de higiene, a conta de água precisou ser parcelada e ele pensou até em se demitir. “Achava que não íamos conseguir pagar meu salário, chegamos a 50% de inadimplência no condomínio”.

A saída encontrada por ele foi se reunir com os condôminos e estipular um prazo para que negociassem a dívida. Deu certo e alguns valores ele conseguiu dividir em até 12 vezes. O síndico profissional Roque Teixeira também recorreu a um maior parcelamento para negociar com condôminos inadimplentes na pandemia. Além disso, ele conta que a situação contribuiu para que até o prazo dado para recorrer à Justiça fosse ampliado.

“Só não retirava juros e multa, porque o regimento interno não permite. Mas percebi que as pessoas queriam pagar e assim que tinham uma chance negociavam. Elas ficaram mais tempo em casa, então passaram a valorizar mais o condomínio, prestaram mais atenção nas despesas dele”, conta Roque.

Perfil do devedor
O presidente da Secovi chama atenção, no entanto, para os moradores que já tinham débitos em aberto antes mesmo da pandemia. De acordo com ele, o síndico deve avaliar os diferentes perfis de inadimplentes e pode dar diferentes condições a eles, “seguindo, claro, o que está no regimento interno e na lei”.

“Algumas pessoas abusam e elas precisam ser olhadas de forma diferente. Mas, no geral, os síndicos não são intransigentes, ainda mais neste momento. Eles procuram viabilizar o pagamento, se preciso pedem até autorização à assembleia para dar uma condição que não está prevista”, explica Kelsor.

Para o economista, essa é a atitude mais indicada. Tentar criar alternativas, negociar e até parcelas é a melhor saída, “é preferível que você assegure uma parcela do que não receber o pagamento neste momento”. Já com relação às despesas do condomínio, a orientação do especialista é que o síndico priorize a folha salarial e, se necessário, parcele as contas com grandes empresas, como concessionárias de água e luz. Ele chama atenção também para a necessidade de uma educação financeira: “o condomínio precisa se preparar para ter uma reserva, porque situações complicadas podem acontecer a qualquer momento”.

A TARDE
Editorial, 15.OUTUBRO.2021 | Postado em Mercado


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